domingo, 10 de janeiro de 2010

Moralismo Puritano

As atribulações da senhora Robison













Famosa por seu extremismo religioso e puritanismo, a mulher do principal ministro de Ulter, na Irlanda do Norte, é protagonista de um escândalo político-sexual.

Iris Robinson é um devotíssima cristã, protestante pentecostal e membro do Tabernáculo Metropolitano de Belfast. É também mulher do principal ministro da Irlanda do Norte, Peter Robison.
Ela mesma é deputada em Westminster e na Assembléia de Úlster, e bastante conhecida por sua forte personalidade e a tendência de apelar para a Bíblia de modo a justificar seu extremismo religioso e seu puritanismo nos costumes. Amaldiçoa o homossexualismo, por exemplo. E a infideidade conjugal.

Kirk McCambley é filho de um açougueiro de um bairro protestante de Belfast. Na época com 19 anos, tinha a madura Iris, na faixa dos 40, como uma de suas clientes. No leito de morte do pai de Kirk, Iris se comprometeu a cuidar do seu filho. Seu maternal desvelo por ele acabou convertendo-os em amantes.

Todo político, como qualquer cidadão, tem direito a uma vida privada. Mas um político que apela à religião para tentar impor um modelo de comportamento à sua comunidade, tem que ser consequente com seu credo. E dar o bom exemplo.

Iris Robinson é a mesma pessoa que, na fase das eleições primárias para a escolha dos candidatos à presidência dos Estados Unidos, censurou Hillary Clinton por ter perdoado as infidelidades do seu marido. "Nenhuma mulher pode aceitar o que ela tolerou quando seu marido era presidente. Ela só estava pensando no futuro de sua própria carreira", decretou Iris.

Há mais do que hipocrisia e adultério nas atuais atribulações da senhora Robinson.

Quando o pai de Kirk morreu, Iris decidiu transformar o amante em empresário. Conseguiu dinheiro com construtores amigos para que ele abrisse um café ao sul de Belfast. E sendo conselheira da prefeitura, conseguiu licença para a abertura do café.

Do dinheiro obtido para o amante, Iris ficou com 10%. Quando o romance acabou, Iris exigiu a devolução de todo o dinheiro - o equivalente a quase R$ 60 mil. Alegou que doaria metade para financiar as despesas de sua igreja. Foi quando estourou o escândalo.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

Rainer Maria Rilke







" Primeira Elegia de Duíno"

Quem, se eu gritasse, entre as legiões dos Anjos
me ouviria? E mesmo que um deles me tomasse
inesperadamente em seu coração, aniquilar-me-ia
sua existência demasiado forte. Pois que é o Belo
senão o grau Terrível que ainda suportamos
e que admiramos porque, impassível, desdenha
destruir-nos? Todo Anjo é terrível.
E eu me contenho, pois, e reprimo o apelo
do meu soluço obscuro. Ai, quem nos poderia
valer? Nem Anjos, nem homens
e o intuitivo animal logo adverte
que para nós não há amparo
neste mundo definido. Resta-nos, quem sabe,
a árvore de alguma colina, que podemos rever
cada dia; resta-nos a rua de ontem
e o apego cotidiano de algum hábito
que se afeiçoou a nós e permaneceu.
E a noite, a noite, quando o vento pleno dos espaços
do mundo desgasta-nos a face - a quem furtaria ela,
a desejada, ternamente enganosa, sobressalto para o
coração solitário? Será mais leve para os que se amam?
Ai, apenas ocultam eles, um ao outro, seu destino.
Não o sabias? Arroja o vácuo aprisionado em teus braços
para os espaços que respiramos - talvez pássaros
sentirão o ar mais dilatado, num vôo mais comovido.

Sim, as primaveras precisavam de ti.
Muitas estrelas queriam ser percebidas.
Do passado profundo afluía uma vaga, ou
quando passavas sob uma janela aberta,
uma viola d'amore se abandonava. Tudo isto era missão.
Acaso a cumpriste? Não estavas sempre
distraído, à espera, como se tudo
anunciasse a amada? (Onde queres abrigá-la,
se grandes e estranhos pensamentos vão e vem
dentro de ti e, muitas vezes, se demoram nas noites?)
Se a nostalgia vier, porém, canta as amantes;
ainda não é bastante imortal sua celebrada ternura.
Tu quase as invejas - essas abandonadas
que te pareceram tão mais ardentes que as
apaziguadas. Retoma infinitamente o inesgotável
louvor. Lembra-te: o herói permanece, sua queda
mesma foi um pretexto para ser - nascimento supremo.
Mas as amantes, retoma-as a natureza no seio
esgotado, como se as forças lhe faltassem
para realizar duas vezes a mesma obra.
Com que fervor lembraste Gaspara Stampa,
cujo exemplo sublime faça enfim pensar uma jovem
qualquer, abandonada pelo amante: por que não sou
como ela? Frutificarão afinal esses longínquos
sofrimentos? Não é tempo daqueles que amam libertar-se
do objeto amado e superá-lo, frementes?
Assim a flecha ultrapassa a corda, para ser no vôo
mais do que ela mesma. Pois em parte alguma se detém.

Vozes, vozes. Ouve, meu coração, como outrora apenas
os santos ouviam, quando o imenso chamado
os erguia do chão; eles porém permaneciam ajoelhados,
os prodigiosos, e nada percebiam,
tão absortos ouviam. Não que possas suportar
a voz de Deus, longe disso. Mas ouve essa aragem,
a incessante mensagem que gera o silêncio.
Ergue-se agora, para que ouças, o rumor
dos jovens mortos. Onde quer que fosses,
nas igrejas de Roma e Nápoles, não ouvias a voz
de seu destino tranquilo? Ou inscrições não se ofereciam,
sublimes? A estela funerária em Santa Maria Formosa...
O que pede essa voz? A ansiada libertação
da aparência de injustiça que às vezes perturba
a agilidade pura de suas almas.

É estranho, sem dúvida, não habitar mais a terra,
abandonar os hábitos apenas aprendidos,
à rosas e a outras coisas singularmente promissoras
não atribuir mais o sentido do vir-a-ser humano;
o que se era, entre mãos trêmulas, medrosas,
não mais o ser; abandonar até mesmo o próprio nome
como se abandona um brinquedo partido.
Estranho, não desejar mais nossos desejos. Estranho,
ver no espaço tudo quanto se encadeava, esvoaçar,
desligado. E o estar-morto é penoso,
e quantas tentativas até encontrar em seu seio
um vestígio de eternidade. - Os vivos cometem
o grande erro de distinguir demasiado
bem. Os Anjos (dizem) muitas vezes não sabem
se caminham entre vivos ou mortos.
Através das duas esferas, todas as idades a corrente
eterna arrasta. E a ambas domina com seu rumor.

Os mortos precoces não precisam de nós, eles
que se desabituam do terrestre, docemente,
como de suave seio maternal. Mas nós,
ávidos de grandes mistérios, nós que tantas vezes
só através da dor atingimos a feliz transformação, sem eles
poderíamos ser? Inutilmente foi que outrora, a primeira
música para lamentar Linos, violentou a rigidez da
matéria inerte? No espaço que ele abandonava, jovem,
quase deus, pela primeira vez o vácuo estremeceu
em vibrações - que hoje nos trazem êxtase, consolo e amparo.

Tradução de Dora Ferreira da Silva.