sábado, 30 de maio de 2015

Martha Galrão, "Palavras"


Uma palavra lasciva: delícia,
uma palavra dengosa.

Duas palavras alegres: peteca e
manhã.

Uma palavra tensa:
tempo.

Uma palavra firme: chão.
Duas palavras tristes: dor e saudade.

Uma palavra livre:
beija-flor.


sexta-feira, 29 de maio de 2015

Maria Helena Nery Garcez, "Precisão"


Não digo
errei todo o discurso de meus anos.
Erraria ainda.

quinta-feira, 28 de maio de 2015

quarta-feira, 27 de maio de 2015

José Paulo Paes, "Canção de exílio"


Um dia segui viagem
sem olhar sobre o meu ombro.

Não vi terras de passagem
Não vi glórias nem escombros.

Guardei no fundo da mata
um raminho de alecrim.

Apaguei a luz da sala
que ainda brilhava em mim.

Fechei a porta da rua
a chave joguei no mar.

Andei tanto nesta rua
que já não sei mais voltar.

terça-feira, 26 de maio de 2015

Donizete Galvão, "A derrocada"


                                                         Para Carlos Loria

Estás sob
 a sombra
de um anjo triste
que traz as asas
esfarrapadas.

Rastejante,
ombros em queda,
já nem tem
plano do voo
ou de partida.

Coberto de terra e cinza,
está exausto de te buscar
nos becos e poços
em que te tens encalacrado.

Exaspera-o a tarefa insípida
de te acompanhar
em tua derrocada anônima,
sem grandezas
que possam ser anunciadas.

segunda-feira, 25 de maio de 2015

domingo, 24 de maio de 2015

Adriano Espínola, "A cebola"


Cortá-la camada
por camada
até chegar

ao centro.

(Ao bulbo do nada
do eu mais
dentro.)

Não chorar.

sábado, 23 de maio de 2015

Odylo Costa, filho, "Soneto da esposa"


Porque não cansa o nosso amor, Senhora,
e vive novo, infante entre os infantes,
brincando as invenções pueris do agora
sem as tristezas vesperais de antes?

Por que não envelhece, e cada hora
não deixa rastro - como os navegantes
que se perderam no mar? Por que, embora
machucado de dores ofegantes,

conserva a graça da manhã nascente?
Por que pisa de leve, e só de manso
chora? Por que ri mesmo no poente?

Talvez, quem sabe?, a luz desse remanso
venha das mãos de Deus. Talvez apenas
seja o lado de lá das nossas penas.

sexta-feira, 22 de maio de 2015

Localizado na Europa, o primeiro território chamado Brasil era uma ilha mágica.


Considerada uma 'ilha mágica', esta porção de terra aparece em diversos mapas da época e os relatos afirmam que o território aparecia apenas a cada sete anos.



Situada próxima à Irlanda, a ilha Brasil foi descoberta em 565 e publicada em dezenas de mapas da época, mas nunca mais foi reencontrada. Diversas expedições tentaram localizá-la ao longo de mil anos, mas todas falharam.
 
Ao contrário do que se imagina, o (nosso!) Brasil não foi o primeiro território a ser batizado com este nome no mapa mundi. Aproximadamente mil anos antes de Pedro Álvares Cabral 'descobrir' as novas terras e nomeá-las de Brasil, os irlandeses já haviam batizado uma ilha com o mesmo nome em seu litoral. Prevendo o futuro ou simplesmente coincidência, este território que estava localizado próximo à Irlanda não era levado muito a sério pelas grandes nações vizinhas.

Um dos 'descobridores' deste outro Brasil foi o famoso capitão John Nisbet que localizou e ganhou dos monarcas da época este pedaço de terra. O único problema foi que nem ele reencontrou a ilha para tomar posse.

Se por aqui o descobridor foi Pedro Álvares Cabral, no Brasil irlandês o primeiro explorador a visitá-la foi o monge São Brandão, em 565. Após o primeiro relato, diversas expedições foram financiadas oficialmente pelos países vizinhos em busca do território. A última tentativa de localizar a ilha ocorreu em 1617 e foi liderada pelo cartógrafo e explorador Willem Jansz Blaeu.

Toda criança aprende na escola que o nome do Brasil deriva da árvore pau-brasil que era abundante no país quando os primeiros exploradores chegaram por aqui. Este fato está certo, mas o que muitos não sabem é sobre a origem da palavra "Brasil" e sua curiosa história. Se a escolha do nome do país foi uma homenagem a primeira riqueza explorada nas terras recém-descobertas há cinco séculos, esta árvore ganhou o nome devido a sua pigmentação de cor vermelha que era utilizada para colorir peças de roupa de luxo.

Se os portugueses nomearam as enormes árvores de Pau-Brasil, os primeiros donos do país, os índios, chamavam o vegetal de 'Araboutan' ou 'Ibira Piranga'. Por mais que a espécie seja de origem brasileira, a terminologia 'Brasil' atravessou o Atlântico nas caravelas vindas da Europa. Em Portugal, os bois com coloração avermelhada eram apelidados de "brazinos" que é um termo irlandês que deriva da palavra gaélica "O’Brasil" que significa "descendentes do vermelho". Com isso, o nome "Brasil" é mais irlandês do que português.


Recolhido no site do Universo on line ( ecoviagem).

Lydio Bandeira de Mello, "Mãe com filho"


quinta-feira, 21 de maio de 2015

Ana Cristina Cesar










"Enquanto leio..."

I

          Enquanto leio meus seios estão a descoberto. É difícil concentrar-me ao ver seus bicos. Então rabisco as folhas deste álbum. Poética quebrada pelo meio.

II

          Enquanto leio meus textos se fazem descobertos. É difícil escondê-los no meio dessas letras. Então me nutro das tetas dos  poetas pensados no meu seio.

quarta-feira, 20 de maio de 2015

Olga Savary, "Mapa de esperança"


Vinha pisando sobre toda a praia,
o sangue quieto — ou quase quieto —
os pensamentos leves como espumas
e os cabelos soltos como nuvens.

Trágica como princesa de elegia,
meu estandarte é o desespero,
minha bandeira, indecisão.

Ainda assim, alegria, te festejo.

segunda-feira, 18 de maio de 2015

Alejandra Pizarnik



"Destruições"

                                                        ... em beijos, não em razões
                                                                                      Quevedo

Do combate com as palavras oculta-me
e apaga o furor do meu corpo elementar.


Tradução amadora minha






Destrucciones*

                                                      ... em besos, no em razones
                                                                                   Quevedo


Del combate com las palavras ocúltame
y apaga el furor de mi cuerpo elemental.




* Em espanhol,  além de destruições, a palavra "destrucciones" também significa alagamento, faxina...
                                                    

domingo, 17 de maio de 2015

Yêda Schmaltz, "Minha alma é triste"


Minha alma é triste
como o cerrado goiano.

Minha alma existe
sem ter achado o que amo.

Minha alma insiste
ao menos na beleza:

poemas feitos de hibiscos
- brincos rubros de princesa.

sexta-feira, 15 de maio de 2015

Geir Campos, "Alba"


Não faz mal que amanheça devagar,
as flores não têm pressa nem os frutos:
sabem que a vagareza dos minutos
adoça mais o outono por chegar.
Portanto, não faz mal que devagar
o dia vença a noite em seus redutos
de leste - o que nos cabe é ter enxutos
os olhos e a intenção de madrugar.

quinta-feira, 14 de maio de 2015

Carlito Azevedo












"Sob o duplo incêndio"

Sob o duplo incêndio
da lua e do neon,

sobre um parapeito de
mármore, entre duas cortinas

jogadas pela brisa marinha
que ao mesmo tempo às suas

coxas e costas dispensava
um hálito incontínuo,

inundando de rubro o restrito
perímetro de seu jarro em cerâmica

e contrastando, imemorial, com a
transitoriedade de tudo ali

(hotel, amor, carros, dia, noite)

uma flor alheia a símbolos

atingia seu ponto máximo
de beleza.

quarta-feira, 13 de maio de 2015

terça-feira, 12 de maio de 2015

Neide Archanjo, "Da morte"


                              I

Qualquer coisa se foi.
Agora sei que a carne apodrece
e apenas o destino me concede
a coragem de suportar a vida assim.

A falta cresce
perversa
e eu não sou Catarina de Médices
em seus jardins.


                            II

Não estamos perdidos.
isto é um milagre. Ter um corpo
uma casa um amigo
manter nas veias o sangue aceso
é um milagre. Saber que houve alguém
que nos acariciou
e nos banhou de lágrimas.


no meio da rua
penso nestas dádivas
antes que a lâmina da morte me atravesse.

segunda-feira, 11 de maio de 2015

Gilberto Mendonça Teles, "Exegese"


Você quer se esconder, então se mostre.
Diga tudo que sabe sobre a vida.
Conte a sua experiência nos negócios,
proclame seu valor de parasita
e deixe que discutam nas casernas
o seu bendito fruto entre as melhores
famílias desta terra.

Depois esconda tudo num poema
e fique descansado: ninguém lê.
Se ler, começam logo a ver navios
e achar que tudo é poetagem, símbolos,
desejos reprimidos,
                           psicanálise,
o diabo a quatro.

O poema não é uma caverna
sigilosa, com sombras tautológicas
nas paredes.

O poema é simplesmente
a sombra sem caverna, o vulto espesso
de si mesmo, a parábola mais reta
de quem escreve torto,
                                     como um deus
canhoto de nascença.

sábado, 9 de maio de 2015

Adriano Espínola, "O urubu"


                                 A José Alcides Pinto

Plana pleno sobre a praia
deserta.
Dunas aparam nas costas
a sombra vigilante de seu voo.

Heráldico
espia do alto as horas tombando
sobre a eternidade dos
elementos.

Negro
parceiro do sol recolhe na
areia
(qual poeta de asas pensas)
o podre
do tempo.

sexta-feira, 8 de maio de 2015

Ivan Junqueira, "Essa música"


Essa música que retorna
como perfume de uma rosa,
essa música que se entorna
de uma ânfora por cujas bordas
escorre ainda o mel de outrora,
essa música insidiosa
numa antiquíssima harpa eólica:
seria o vento em suas cordas?
Seria Orfeu vindo das forjas
do inferno a que baixou, apóstata,
em busca da filha de Apolo,
Eurídice, a esposa morta
por quem até hoje chora?       
Não é nada enfim. Tudo dorme.
Há, sim, alguém que à noite acorda
e vê-se em ruínas, sem memória
de um tempo que fugiu, mas volta
nessa música que se entorna,
e vai e vem, e vem e torna,
nessa música que retorna
como o perfume de uma rosa.

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Afrescos minoicos no Palácio de Knossos.






















O Palácio de Knossos foi construído na Ilha de Creta, no ano de 2.000 a.C e destruído por um terremoto em 1.700 a.C.

quarta-feira, 6 de maio de 2015

Ibn al-Qutiyya, "A noz"


Envoltura de duas peças
tão unidas (que linda vista!):
pálpebras cerradas no sono!

Aberta à faca:
pupila convexa
no esforço de mirar.

À orelha, por suas pregas
e esconderijos,
o seu interior
podes comparar.


Ibn al-Qutiyya foi um poeta íbero-árabe que nasceu em Sevilha em data incerta e morreu em Córdoba no ano de 977.

terça-feira, 5 de maio de 2015

Ivo Barroso, "Atalarico"


Atalarico, rei dos godos, penso
no teu reinado fragoroso e intenso.
Estavas com quinze anos e eras rei!
Rodeado pela inculta e forte grei
dos bárbaros, fizeste do poder
um instrumento a mais do teu prazer.
Com rudes favoritos de tua idade
queimaste em chama viva a mocidade
e, aos dezoito anos, velho e decadente
pelas paixões, morreste plenamente
satisfeito em teu mínimo desejo.
Atalarico, rei devasso, invejo
tua curta existência bem vivida:
morres com a boca transbordando vida.
 

domingo, 3 de maio de 2015

João Cruz e Souza, "Cárcere das almas"


Ah! Toda alma num cárcere anda presa,
Soluçando nas trevas, entre as grades
Do calabouço olhando imensidades,
mares, estrelas, tardes, natureza.

Tudo se veste de uma igual grandeza
Quando a alma entre grilhões as liberdades
Sonha e, sonhando, as imortalidades
Rasga no etéreo Espaço da Pureza.

Ó almas presas, mudas, fechadas
Nas prisões colossais e abandonadas,
Da Dor no calabouço, atroz, funéreo!

Nesses silêncios solitários, graves,
Que chaveiros do Céu possui as chaves
para abrir-vos as portas do Mistério?


sábado, 2 de maio de 2015

Fernando Pessoa - Bernardo Soares, "Livro do Desassossego"













Capítulo 205.

Fluído, o abandono do dia finda entre púrpuras exaustas. Ninguém me dirá quem sou, nem saberá quem fui. Desci da montanha ignorada ao vale que ignoraria, e meus passos foram, na tarde lenta, vestígios deixados nas clareiras da floresta. Todos quanto amei me esqueceram na sombra. Ninguém soube do último barco. No correio não havia notícia da carta que ninguém haveria de escrever.

Tudo, porém, era falso. Não contaram histórias que outros houvessem contado, nem se sabe ao certo do que partiu outrora, na esperança do embarque falso, filho da bruma futura e da indecisão por vir. Tenho nome entre os que tardam, e esse nome é sombra em tudo.

sexta-feira, 1 de maio de 2015