sexta-feira, 13 de julho de 2018

Junqueira Freire, "Desejo (Hora de Delírio)"


Se além dos mundos esse inferno existe,
    Essa pátria de horrores,
Onde habitam os tétricos tormentos,
    As inefáveis dores;

Se ali se sente o que jamais na vida
    O desespero inspira:
Se o suplício maior que a mente finge,
    A mente ai respira;

Se é de compacta, de infinita brasa
    O solo que pisa:
Se é fogo, e fumo, e súlfur, e terrores
    Tudo que ali se visa;

Se ali se goza um gênero inaudito
    De sensações terríveis;
Se ali se encontra esse real de dores
    Na vida não possíveis;

Se é verdade esse quadro que imaginam
    As seitas dos cristãos;
Se esses demônios, anjos maus, ou fúrias,
    Não são erros vãos;

Eu – que tenho provado neste mundo
    As sensações possíveis;
Que tenho ido da afecção mais terna
    Às penas mais incríveis;

Eu – que tenho pisado o colo altivo
    De vária e muita dor;
Que tenho sempre das batalhas dela
    Surgido vencedor;

Eu – que tenho arrostado imensas mortes,
    E que pareço eterno;
Eu quero morrer pra sempre,
    Entrar por fim no inferno!

Eu quero ver se encontro ali no abismo
    Um tormento invencível:
– Desses que achá-los na existência toda
    Jamais será possível!

Eu quero ver se encontro alguns suplícios
    Que o coração me domem;
Quero lhe ouvir esta palavra incógnita:
    – “Chora por fim, – que és homem!”

Que de arrostar as dores desta vida
    Quase pareço eterno!
Estou cansado de vencer o mundo:
    Quero vencer o inferno!


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