segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Walt Whitman



















"Para você"

Seja você quem for, temo que esteja seguindo o caminho
       dos sonhos,
Temo que estas realidades supostas acabem desfeitas sob
       suas mãos e seus pés,
Mesmo agora, suas feições, alegrias, casa, discursos,
       negócios, maneiras, problemas,
desatinos, costumes, crimes, se dissipam ante seus olhos,
Sua alma e seu corpo verdadeiros estão diante de mim,
Eles ficam além das contendas, além do comércio, das
       lojas, do trabalho, das fazendas, das roupas, da casa,
       das compras, das vendas, da comida, da bebida,
       do sofrimento, da morte.

Seja você quem for, agora coloco minha mão sobre você,
       que seja você meu poema,
Com meus lábios sussurro-lhe ao pé do ouvido,
Já amei muitos homens e mulheres, mas ninguém
       mais do que você.

Ó, quanta lerdeza, quanta burrice,
Já devia ter corrido esse caminho a seu encontro
       há muito tempo,
Não devia ter me prendido a bobagens, devia ter
       estado com você, devia ter cantado apenas você.

Vou deixar tudo de lado e sair e elaborar os hinos de você,
Ninguém entende você, só eu entendo,
Ninguém faz justiça a você, nem você faz justiça a você
       mesmo,
Ninguém vê perfeição em você, só eu vejo a perfeição
       que existe em você,
Ninguém poderia deixá-lo livre, só eu serei aquele que
       jamais consente em subordiná-lo,
Só eu sou aquele que não coloca você sob o poder de
       senhor, proprietário, apostador,
Deus, que está além do que espera no mais profundo
       de você mesmo.

Pintores tem pintado suas multidões e a figura central
       delas,
Da cabeça da figura central se estende um halo de luz
       dourada,
Mas eu pinto miríades de cabeças e não pinto cabeça
       alguma sem seu halo de luz dourada,
Da minha mão, da cabeça de todo homem e toda mulher
       ele nasce, reluzente e fuindo para sempre.

Ó, eu poderia cantar tais grandezas e glórias a seu respeito !
Você ainda não sabe o que você é, você tem cochilado
       sobre si mesmo a vida inteira,
Suas pálpebras têm sido as mesmas pálpebras fechadas
       a maior parte do tempo,
O que você tem feito retorna a você cheio de ironia,
(Sua parcimônia, seu conhecimento, suas rezas, se elas
       não retornam em ironias, o que é seu retorno ?)

As ironias não são você,
Debaixo delas e nelas, vejo você sem saída,
Possuo você onde ninguém mais pode possuí-lo,
Silêncio, a escrevaninha, a expressão petulante, a noite,
       a rotina, se essas coisas afastam você dos demais,
       elas não afastam você de mim,
O rosto barbeado, o olho mortificado, o corpo impuro,
       se essas coisas obstruem você, elas não me obstruem,
O hálito impertinente, a postura incorreta, a bebedeira,
       a gula, a morte prematura, todas essas coisas eu deixo de lado.

Não há dom em um homem ou mulher que não esteja registrado
       em você,
Não há virtude, não há beleza em um homem ou mulher que não
       seja igual em você,
Não há vigor, não há duração em outros que não seja igual
       em você,
Não há prazer à espera de outros que não seja igual ao prazer que
       espera por você.

Quanto a mim, não dou nada a ninguém que não possa dar da
       mesma forma, cuidadosamente a você.
Canto as canções de glória a ninguém, nem a Deus, mais cedo
       do que canto as canções de glória a você.

Seja você quem for ! Clame pelo que é seu em qualquer
       circunstância !
Tudo que há de espetacular no Leste e no Oeste é pequeno
       se comparado a você,
Essas imensas pradarias, esses rios intermináveis, você é imenso
       e interminável como eles,
Essas fúrias, elementos, tempestades, movimentos da Natureza,
       gritos de aparente dissolução, você, homem ou mulher, é
       quem domina essas coisas,
Senhor ou senhora da Natureza, dos elementos, da dor, da paixão,
       da dissolução, por direito próprio.

As correntes caem de seus tornozelos, você descobre uma
       suficiência infalível,
Velho ou jovem, homem ou mulher, bruto, baixo, rejeitado
       por todos, seja você quem for, proclame a si mesmo.
Através do nascimento, da vida, da morte, do funeral,
       os meios estão ao seu alcance, nada é limitado ou menor,
Através da raiva, da perda, da ignorância, do tédio, da ambição,
       o que você é escolhe seu caminho.

Tradução de Bruno Gambarotto.

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