O homem velho, desenganado de tudo,
da soleira da porta, sob o sol cálido,
observa o cão e a cadela a satisfazerem o instinto.
Sobre a sua boca desdentada perseguem-se as moscas.
A sua mulher há muito que morreu. Também ela,
como todas as cadelas, não queria saber disso,
mas não lhe faltava o instinto. O homem velho cheirava o ar
- ainda tinha dentes -, a noite vinha,
metiam-se na cama. Era bonito o instinto.
O que agrada no cão é a grande liberdade
De manhã à noite vagueia pela rua;
e ora come, ora dorme, ora monta cadelas:
não espera sequer pela noite. Raciocina
com o faro, e os cheiros que sente são seus.
O homem velho recorda-se de uma vez
em que o fez como os cães, de dia, no meio duma seara.
Já não sabe com que cadela, mas lembra-se do grande sol
e do suor e da vontade de nunca mais acabar.
Era como numa cama. Se os anos voltassem,
gostaria de o fazer sempre no meio duma seara.
Desde a rua uma mulher e pára a olhar;
o padre passa e volta-se. Na praça pública
pode-se fazer tudo. E até a mulher,
que tem pudor em voltar-se para o homem, pára.
Só um rapaz não tolera o jogo
e faz chover pedras. O homem velho indigna-se.
sexta-feira, 18 de setembro de 2009
Cesare Pavese, "O Instinto"
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