sábado, 21 de maio de 2011

A CINZA DAS HORAS, de Manuel Bandeira


















Manuel Bandeira publicou "A Cinza das Horas", seu primeiro livro, em 1917. Era uma edição de 200 exemplares custeada pelo autor. Acredito que o livro não tenha sobrevivido por sí, mas pela importância que MB passou a ter na literatura de língua portuguesa.

Antônio Cândido diz que esse livro faria parte do estilo que ele chama de "Penumbrismo"

Mesmo assim, gosto de alguns poemas que provavelmente teriam se perdido, como soe acontecer com a maioria do que é editado.

No "Itinerário de Passargada", que é visto como uma pequena autobiografia literária, assim MB escreve:

"O meu primeiro livro viria a ser impresso no Brasil, nas oficinas do Jornal do Comércio, dirigidas então pelo simpático Rios, homem gordo, bonachão e paciente com os poetas estreantes que queriam subverter as normas tradicionais da arte tipográfica. A tiragem foi de apenas duzentos exemplares e custou trezentos mil-réis... Bons tempos!

A Cinza das Horas não continha tudo o que eu havia escrito até 1917, data da publicação. Fizera eu uma escolha, preferindo os poemas que me pareciam ligados pela mesma tonalidade de sentimento, pelas mesmas intenções de fatura. O sentimento ia resumido, programado por assim dizer, nos versos, já transcritos, de Maeterlinck. A fatura já não era de modelo parnasiano e sim simbolista, mas de um simbolismo não muito afastado do velho lirismo português. Os sonetos a Camões e a Antônio Nobre são claros indícios disto. Nada tenho para dizer desses versos, senão que ainda me parecem hoje, como me pareciam então, não transcender a minha experiência pessoal, como se fossem simples queixumes de um doente desenganado, coisa que pode ser comovente no plano humano, mas não no plano artístico. No entanto, publiquei o livro, ainda que sem intenção de começar carreira literária: desejava apenas dar-me a ilusão de não viver inteiramente ocioso.

Não fiz grande distribuição do folheto, senão entre parentes e amigos. E um dos motivos foi que, tendo mandado um exemplar a Bilac, não recebi nenhuma resposta. Como na ocasião tivesse conhecido em Petrópolis a Flexa Ribeiro e a Leal de Sousa, ofereci-lhes o volume. Foram eles muito amáveis comigo. O primeiro dedicou-me todo um rodapé na Notícia, onde colaborava semanalmente; e o segundo meia página da Careta. Américo Facó escreveu uma nota na Fon-Fon, assinalando as raízes portuguesas do meu lirismo. José Oiticica, que fazia crítica literária, não me lembra agora em que jornal, ocupou-se do livro lisonjeiramente, transcrevendo, entre outras coisas, o soneto “Um Sorriso”. Afonso Lopes de Almeida escreveu na edição vespertina do Jornal do Comércio, com afetuoso carinho de amigo, o primeiro que fiz no mundo literário. No mesmo jornal fui saudado em comprido artigo por Castro Meneses. Mas a crítica mais desvanecedora, por inesperada, foi a de João Ribeiro no Imparcial. Não tratou naquele dia senão do meu livro e deu ao artigo o título “A Poesia Nova”. Começava assim: “Eis aqui um excelente e verdadeiro poeta. Por que verdadeiro e excelente? Eis também uma questão de resposta difícil.” Mais adiante dizia: “A Cinza das Horas, pequenino volume, é neste momento um grande livro. De tal arte nos havíamos estragado o gosto com o abuso das convenções, dos artifícios e das nigromâncias mais esdrúxulas, que esta volta à simplicidade e ao natural é uma consolação reparadora e saudável.” Transcrevendo a “Canção de Maria”, comentava: “... soa aos meus ouvidos como se fossem voltas e redondilhas camonianas. Têm a mesma suavidade e frescor que ainda conservam as do extraordinário lírico português.” Temperava esses elogios, tão cordiais, com uma advertência onde havia uma lição admirável e que muito me valeu: “Na Cinza das Horas há ainda uma ou outra rara poesia que parece um funesto tributo às manias reinantes. É, todavia, exceção rara, sendo quase tudo de uma arte primorosa, daquela melodia ingênita que Carlyle atribuía a todas as coisas do coração. Os elementos de sua arte são simples como as coisas eternas: céu, água e uma voz errante bastam aos seus quadros:

És como um lírio
Nascido ao pôr-do-sol à beira d’água
Numa paisagem triste, onde cantava um sino...

João Ribeiro não transcreveu a quadra completa, que era assim:

“És como um lírio alvo e franzino
Nascido ao pôr-do-sol à beira d’água
Numa paisagem triste, onde cantava um sino
A de nascer inconsolável mágoa...”

Era como se o mestre dissesse: “Nesse poema de oito versos o que importa como poesia são as palavras que transcrevi: o resto é enchimento, é matéria morta, que deve ser alijada.” Meditei na lição e até hoje em toda poesia que escrevo me lembro dela e procuro só pronunciar as palavras essenciais".


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Gostaria de destacar a consideração que MB faz sobre o conceito do artístico:
"Nada tenho para dizer desses versos, senão que ainda me parecem hoje, como me pareciam então, não transcender a minha experiência pessoal, como se fossem simples queixumes de um doente desenganado, coisa que pode ser comovente no plano humano, mas não no plano artístico".

Essa diferença entre o confessional e o artístico ainda hoje é confusa para muitos. E, apesar da sua autoavaliação negativa, acho que em alguns poemas (ou partes deles), MB ultrapassa o tom confessional e já apresenta alguns achados e soluções poéticas bem elaboradas.

Aliás, embora sua importância na literatura brasileira venha de poemas em que ele rompe com a forma dos poemas deste livro, MB nunca o renegou.

Também acho deliciosamente sincera sua confissão de que publicou o livro sem intenção de começar carreira literária, mas apenas para se dar a ilusão de não viver inteiramente ocioso.


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"DESENCANTO

Eu faço versos como quem chora
De desalento... de desencanto...
Fecha o meu livro, se por agora
Não tens motivo nenhum de pranto.

Meu verso é sangue. Volúpia ardente...
Tristeza esparsa... remorso vão...
Dói-me nas veias. Amargo e quente,
Cai, gota a gota, do coração.

E nestes versos de angústia rouca
Assim dos lábios a vida corre,
deixando um acre sabor na boca.
- Eu faço versos como quem morre".


Teresópolis, 1912.

É o segundo poema do livro, e a escolha dessa posição não deve ter sido aleatória. Gosto dele pela unidade da amargura e tristeza confessadas; o poema começa amargo e triste, prossegue do mesmo modo, e termina ainda pior, pois se no início o autor fazia versos como quem chora, no final já os faz como quem morre.

Acho que o tom quase mórbido deriva diretamente do seu estado de saúde, pois a tuberculos era uma doença normalmente fatal àquela época. Sobretudo se consideramos que, sendo datado de 1912, é anterior a sua estadia em Clavadel.

Mas penso que, originalmente, teria a forma de um soneto, pois os dois primeiros quartetos tem uma ligação muito forte, mas, entre eles e o quarteto final parece-me que falta alguma coisa. Há uma certa descontinuidade. Talvez existisse uma outra estrofe que ele não conseguiu "resolver" adequadamente, sendo forçado a suprimí-la na revisão final, pois o último quarteto tem o estilo conclusivo de um terceto final de soneto.

É interessante que é datado de 1912, antes da sua temporada em Clavadel, e cinco anos antes da publicação deste primeiro livro, mas já faz menção a um livro:"...Fecha o meu livro, se por agora..."
Destaque-se, também, o final:" - Eu faço versos como quem morre".

Aliás, a coda será sempre muito utilizada pelo poeta.


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"PAISAGEM NOTURNA

A sombra imensa, a noite infinita enche o vale . . .
E lá do fundo vem a voz
Humilde e lamentosa
Dos pássaros da treva. Em nós,
— Em noss'alma criminosa,
O pavor se insinua . . .
Um carneiro bale.
Ouvem-se pios funerais.
Um como grande e doloroso arquejo
Corta a amplidão que a amplidão continua . . .
E cadentes, metálicos, pontuais,
Os tanoeiros do brejo,
— Os vigias da noite silenciosa,
Malham nos aguaçais.

Pouco a pouco, porém, a muralha de treva
Vai perdendo a espessura, e em breve se adelgaça
Como um diáfano crepe, atrás do qual se eleva
A sombria massa
Das serranias.

O plenilúnio via romper . . . Já da penumbra
Lentamente reslumbra
A paisagem de grandes árvores dormentes.
E cambiantes sutis, tonalidades fugidias,
Tintas deliqüescentes
Mancham para o levante as nuvens langorosas.

Enfim, cheia, serena, pura,
Como uma hóstia de luz erguida no horizonte,
Fazendo levantar a fronte
Dos poetas e das almas amorosas,
Dissipando o temor nas consciências medrosas
E frustrando a emboscada a espiar na noite escura,
— A Lua
Assoma à crista da montanha.
Em sua luz se banha
A solidão cheia de vozes que segredam . . .

Em voluptuoso espreguiçar de forma nua
As névoas enveredam
No vale. São como alvas, longas charpas
Suspensas no ar ao longe das escarpas.
Lembram os rebanhos de carneiros
Quando,
Fugindo ao sol a pino,
Buscam oitões, adros hospitaleiros
E lá quedam tranqüilos ruminando . . .
Assim a névoa azul paira sonhando . . .
As estrelas sorriem de escutar
As baladas atrozes
Dos sapos.

                                            E o luar úmido . . . fino . . .
Amávico . . . tutelar . . .
Anima e transfigura a solidão cheia de vozes . . .
"

Teresópolis, 1912

É um poema descritivo.
Quanto à temática, é o misticismo inicial o que mais aprecio.
Não é um misticismo oriundo de uma religião ou por ela resolvido, mas em estado bruto. É o medo da noite e seus ruídos diante do "homem só".

Inicialmente, não existe a intenção de compreender nada, é a constatação passiva do poder da noite sem hierarquias e explicações racionais ou mitológicas, e sem um Deus para organizar a vida ou aliviar o sentimento do medo da escuridão e do desconhecido.

A única interferência no medo da noite também vem da natureza: A Lua.
Mas, aí, aparece uma lua humanizada, amiga dos poetas, das almas amorosas, que dissipa o temor nas consciências medrosas e frustra a emboscada a espiar na noite escura (não a posterior "Coisa em sí, - Satélite").
Neste momento também lemos a única interferência religiosa, que vem do belo verso com esta imagem de referência católica:
"Como uma hóstia de luz erguida no horizonte".

A partir da lua, o poema abandona suas trevas e assume um tom lírico, com uma quase esperança confirmada no seu encerramento:

                                            "E o luar úmido . . . fino . . .
Amávico . . . tutelar . . .
Anima e transfigura a solidão cheia de vozes . . .


Ou seja, a solidão e as vozes continuam, embora já animadas e transfiguradas devido à lua.

Quanto à técnica do verso, eu aprecio muito esse estilo intermediário entre os versos livre e o rimado (que também utilizo nos meus poemas); é um texto quase em prosa disposto em versos, sem métrica, e apenas com algumas rimas pontuais para dar ritmo e realçar algumas passagens. MB diria, mais tarde sentir horror a esse estilo meio-termo.

A palavra "Amávica", no penultimo verso, eu não achei na internet nem no Aurélio. Mas acredito que seja alguma forma derivada ou criada a partir de amável, ou amante.

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"VERSOS ESCRITOS N'ÁGUA

Os poucos versos que aí vão,
Em lugar de outros é que os ponho.
Tu que me lês, deixo ao teu sonho
Imaginar como serão.

Neles porás tua tristeza
Ou bem teu júbilo, e, talvez,
Lhes acharás, tu que me lês,
Alguma sombra de beleza...

Quem os ouviu não os amou.
Meus pobres versos comovidos!
Por isso fiquem esquecidos
Onde o mau vento os atirou.
"

O que eu admiro nesse pequeno poema é o artifício de composição; a sacada.
Nele, lemos um poema onde o poeta nos avisa que os versos eram outros, e que ele colocou estes no lugar daqueles, e diz que deixa ao sonho do leitor imaginar como aqueles serão. E prossegue sugerindo-nos que, ao imaginá-los, neles coloquemos um pouco de tristeza ou júbilo, porque, assim, talvez achemos alguma sombra de beleza.

E, por fim, explica-nos que o motivo de tê-los trocado: por eles, sua musa não se interessou:"Quem os ouviu não os amou".

Acho que os três últimos versos do quarteto final são dispensáveis.
Mas a sacada é ótima.

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"INSCRIÇÃO

Aqui, sob esta pedra, onde o orvalho roreja,
Repousa, embalsamado em óleos vegetais,
O alvo corpo de quem, como uma ave que adeja,
Dançava, descuidosa, e hoje não dança mais...

Quem não a viu é bem provável que não veja
Outro conjunto igual de partes naturais.
Os véus tinham-lhe ciúme. Outras, tinham-lhe inveja.
E ao fitá-la os varões tinham pasmos sensuais.

A morte a surpreendeu um dia que sonhava,
Ao pôr do sol, desceu entre sombras fiéis
À terra, sobre a qual tão de leve pesava...

Eram as suas mãos mais lindas sem anéis...
Tinha os olhos azuis.... Era loura e dançava....
Seu destino foi curto e bom...
                                                        - Não a choreis.
"

Gosto deste soneto. E nem sei porque gosto tanto.
É o mito da mulher bonita e desejada, que vive intensamente e morre jovem. Também creio que é uma homenagem dele à coragem das pessoas que correm o risco de viver pouco, trocando a longevidade pela intensidade; coragem que ele aparentemente não teve.

Infelizmente, o soneto não está datado.

Mas me parece bem construído, e a coda é interessante:
"- Não a choreis".
.
"Sua vida desregrada não merece o nosso choro ?" ou "Não choremos por quem foi feliz usufruindo a vida ?"
Na fábula da Formiga e a Cigarra, ela não seria a formiga trabalhadora.

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"PLENITUDE

Vai alto o dia. O sol a pino ofusca e vibra.
O ar é como de forja. A força nova e pura
Da vida embriaga e exalta. E eu sinto, fibra a fibra,
Avassalar-me o ser a vontade da cura.

A energia vital que no ventre profundo
Da Terra estuante ofega e penetra as raízes,
Sobe no caule, faz todo galho fecundo
E estala na amplidão das ramadas felizes,

Entra-me como um vinho acre pelas narinas...
Arde-me na garganta... E nas artérias sinto
O bálsamo aromado e quente das resinas
Que vem na exalação de cada terebinto.

O furor de criação dionisíaco estua
No fundo das rechãs, no flanco das montanhas,
E eu observo-o nos sons, na glória da luz crua
E ouço-o ardente bater dentro de minhas entranhas.

Tenho êxtase de santo... Ânsias para a virtude...
Canta em minh'alma absorta um mundo de harmonias.
Vêm-me audácias de herói... Sonho o que jamais pude
- Belo como Davi, forte como Golias...

E neste curto instante em que me exalto
de tudo o que não sou, gozo o que invejo,
E nunca o sonho humano assim subiu tão alto
Nem flamejou mais bela a chama do desejo.

E tudo isso me vem em vós, Mãe Natureza!
Vós que cicatrizais minha velha ferida ...
Vós que me dais o grande exemplo de beleza
E me dais o divino apetite da vida.
"

Clavadel, 1914

O que gosto nesse poema, escrito em Clavadel, é o entusiasmo, um sentimento raro de se encontrar na sua obra normalmente triste, descrente e cética.
É uma ode à força da natureza e à vida.

Como sabemos da sua luta com a tuberculose, fica nítido que a origem do poema é real e autobiográfica; não é um exercício poético. E, sendo real, fica mais difícil ainda administrar artisticamente o impulso criador sem ceder totalmente à realidade, mas deixando que o sentimento poético a envolva.

Quem já esteve doente e se curou sabe que, no momento em que começamos a nos convencer da possibilidade do restabelecimento, cresce um entusiasmo e uma confiança muito forte. Imagino que, sobretudo, para quem já está desenganado. No poema, sinto isso no verso: "E ouço-o ardente bater dentro de minhas entranhas"

O momento em que ele festeja o reencontro com sua energia é muito bonito e interessante pelo achado de juntar Davi com Golias no mesmo verso, assim como as afirmações sobre as audácias de herói, os sonhos que jamais pode ter, sua exaltação de tudo que não é, e o seu gozo de tudo que inveja, indicando que já anteve e confia na cura:

"Vêm-me audácias de herói... Sonho o que jamais pude
- Belo como Davi, forte como Golias...

E neste curto instante em que me exalto
de tudo o que não sou, gozo o que invejo,"


E, como no poema ele considera que sua cura vem da natureza, vem da "energia vital que no ventre profundo da Terra estuante ofega e penetra as raízes", termina homenageando-a:

"E tudo isso me vem de vós, Mãe Natureza!
Vós que cicatrizais minha velha ferida ...
Vós que me dais o grande exemplo de beleza
E me dais o divino apetite da vida".


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"NATAL

Penso em Natal. No teu Natal. Para a bondade
A minh'alma se volta. Uma grande saudade
Cresce em todo o meu ser magoado pela ausência.
Tudo é saudade... A voz dos sinos... A cadência
Do rio... E esta saudade é boa como um sonho!
E esta saudade é um sonho... Evoco-te... Componho
O ambiente cuja luz os teus cabelos douram.
Figuro os olhos teus, tristes como eles foram
No momento final de nossa despedida...
O teu busto pendeu como um lírio sem vida,
E tu sonhas, na paz divina do Natal...
Ó minha amiga, aceita a carícia filial
De minh'alma a teus pés humilhada de rastos.
Seca o pranto feliz sobre os meus olhos castos...
Ampara a minha fronte, e que a minha ternura
Se torne insexual, mais do que humana - pura
Como aquela fervente e benfazeja luz
Que Madalena viu nos olhos de Jesus..."


Clavadel, 1913

O que me atrai nesse poema é sua temática e seu final.
Me parece que no natal, MB lembra de um natal específico passado com uma mulher com quem teve uma relação bastante carnal (conforme sugerido nos dois últimos versos), mas que, agora, a memória a traz como saudade e sentimento de amizade.

Uma amizade que pode até ser ainda mais casta por não trazer um tesão sexual mal resolvido, pois o desejo, que havia, consumado foi.
É a saudade da amizade do ex-amor, que, aliás, é bastante raro.

É bonito quando ele diz: "Seca o pranto feliz sobre os meus olhos castos...!"

E mais bonito ainda quando continua:
"...e que a minha ternura
Se torne insexual, mais do que humana - pura"


E o final, além de ser um feliz achado, também dá a pista da carnalidade que havia na relação, pois ao desejar que sua ternura se torne pura, indica que, no passado, pura não era.

Mas a deseja pura "Como aquela fervente e benfazeja luz
Que Madalena viu nos olhos de Jesus..."


Enfiar Jesus e Madalena num verso é uma imagem especialmente bonita, de quem só deseja a amizade casta em uma relação que teria sido bastante carnal, pois na tradição católica Madalena é a ex-prostituta que se converteu ao cristianismo.

Também gosto quando informa que a moça é loura criando esta imagem:
"..................................Componho
O ambiente cuja luz os teus cabelos douram".

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