sexta-feira, 30 de dezembro de 2011

Jorge de Lima, "A noite desabou sobre o cais"


A noite desabou sobre o cais
pesada, cor de carvão.
Rangem guindastes na escuridão.
Para onde vão essas naus ?
Talvez para as Índias.
Para onde vão.

Capitão-mor, capitão-mor,
quereis me dizer onde é que fica
a ilha de São Brandão ?

A noite desabou sobre o cais
pesada, cor de carvão.
Rangem guindastes na escuridão.
Donde é que vêm essas naus ?

Serão caravelas ? Serão negreiros ?
São caravelas e negreiros.
Há sujos marujos na caravelas.

Há estrangeiros que ficaram negros
de trabalharem no carvão.
Homens da estiva trabalham, trabalham,
sobem e descem nos porões,
Para onde vão essas naus ?

Saltam emigrantes embuçados,
mulheres, crianças na escuridão.
De onde vêm essa gente ?
Não há mais terras de Santa Cruz gente valente !

Ó indesejáveis qual país,
qual o país que desejais ?
Como é o nome dessas naus
que não se lê na escuridão ?
Vão descobrir o Preste João ?
Na minha geografia existe apenas
perdido no mar o cabo Não.

A noite desabou sobre o cais
pesada, cor de carvão.

Essas naus vão para o Congo ?
Castelo de Sagres ficou aonde ?
Capitão-mor onde é o Congo ?
Será no leste, no mar tenebroso ?
Capitão-mor perdi-me no mar.
Onde é que fica a minha ilha ?

Para onde vão os degredados,
os que vão trabalhar desntro da noite,
ouvindo ranger esses guindastes ?

Capitão-mor que noite escura
desabou sobre o cais,
desabou nesse caos.

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