domingo, 9 de novembro de 2014

Ruy Castro














"O falso Fla-Flu"

RIO DE JANEIRO - Vários analistas tacharam de "Fla-Flu" a campanha presidencial. Referiam-se à troca de acusações, mentiras, calúnias, rasteiras e golpes baixos, equiparando-a em ferocidade à que supostamente se dá entre as torcidas mais tradicionais do Brasil: as de Flamengo e Fluminense. Como Flamengo que sou, discordo. Em 102 anos de rivalidade, rubro-negros e tricolores nunca se rebaixaram ao nível que observamos nos últimos três meses.

O Fla-Flu não é uma guerra. É uma celebração, uma festa, um Carnaval comum às duas torcidas. É um embate de adversários, não de inimigos. Pela riqueza de suas cores e bandeiras nas arquibas, o Fla-Flu é também o mais belo espetáculo de futebol do mundo –segundo todos os turistas que já levei ao Maracanã para assisti-lo. E essa afinidade não é de hoje.

O Flamengo nasceu em 1895 como um clube de regatas; o Fluminense, em 1902, como um de futebol. O presidente do Flamengo assinou a ata de fundação do Fluminense; pouco depois, um fundador do Fluminense foi presidente do Flamengo. Os clubes eram vizinhos na rua Paissandu. O futebol do Fluminense torcia pelo Flamengo no remo e vice-versa. Em fins de 1911, um grupo de jogadores do Fluminense rebelou-se contra sua diretoria, deixou o clube e levou seu futebol para o Flamengo. A 12 de julho de 1912, os dois se enfrentaram pela primeira vez. Surgia o Fla-Flu.

A maior crônica sobre o Flamengo, "Flamengo sessentão", de 1955, foi escrita por um tricolor: Nelson Rodrigues, cujo segundo clube era o Flamengo. O Fla-Flu de 1963 reuniu 177.020 pagantes no Maracanã, sem uma briga, um bofetão. Eu próprio sou casado há 24 anos com uma tricolor, e também sem uma briga, um bofetão. E por aí vai.

Se disserem que a guerra Dilma x Aécio lembrou um Vasco x Flamengo ou Flamengo x Botafogo, não terei nada a opor.

Crônica publicada no jornal "Folha de S. Paulo" em 09/11/2014.

 

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