sábado, 24 de outubro de 2015

Lúcio Cardoso, 1º dos "Poemas do Colégio Interno"


Nunca eu soubera o segredo da alegria alheia.
Ouvia os risos que enchiam o pátio de recreio
e sofria dessa dor sem nome de sentir a vida
muito mais cedo do que os outros sentem.

O sol refulgia no dorso branco dos muros
e trazia o desejo como a morte aos caminhantes.
Mas que estranha maldição tinha tombado nos meus ombros
para que só eu sentisse o frio das grandes árvores solitárias?

É certo que lutava para compreender o menino triste,
insensível à agitação em torno.
Sabia que ele tinha medo do ruído que ouvia,
mas também tinha medo do silêncio que devora.

E em breve, vendo o tempo crescer como a noite das águas,
reconheci a meninice que fugia
e senti mais funda a dor de compreender
o terrível e frágil segredo das horas.

Quis deter o menino que morria,
quis falar alguma coisa ainda não dita,
uma palavra, um soluço,
um riso que era como a sombra de um outro ser,
vivendo no meu sangue.
Mas era muito tarde
e eu sentia os anos implacáveis que chegavam.

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