segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018
Fernando Pessoa, "Nas grandes horas em que a insónia avulta..."
Nas grandes horas em que a insónia avulta
Como um novo universo doloroso,
E a mente é clara como um ser que insulta
O uso confuso com que o dia é ocioso,
Cismo, embebido em sombras de repouso
Onde habitam fantasmas e a alma é oculta,
Em quanto errei e quanto ou dor ou gozo
Me farão nada, como frase estulta.
Cismo, cheio de nada, e a noite é tudo.
Meu coração, que fala estando mudo,
Repete seu monótono torpor
Na sombra, no delírio da clareza,
E não há Deus, nem ser, nem Natureza
E a própria mágoa melhor fora dor.
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